sexta-feira, 17 de fevereiro de 2012

O carnaval e suas máscaras

“Olhando na quarta-feira as ruas vazias, com os garis dando um jeito em nossa moral, custei a compreender que fantasia é um troço que o cara tira no carnaval, e usa nos outros dias por toda a vida…” Esse é o início de uma música do João Bosco Mucci, mineiro de Ponte Nova, que faz sucesso em várias partes do mundo. A música faz uma crítica à hipocrisia da sociedade, aos que vivem num mundo de faz-de-conta, representam o papel de algo que não são. Sua poesia faz pensar. O carnaval marca muito a vida de
grande parte dos brasileiros. Traz alegria, descanso, entretenimento e… lições. O Brasil se transforma mesmo numa festa nesses dias. Quase tudo para. Naturalmente, em alguns lugares, como no Rio de Janeiro, essa festa já perdeu bastante do aspecto popular. Tornou-se uma indústria. Indústria dos sonhos (para muitos) e dos lucros (para alguns poucos). No carnaval das grandes avenidas e das empresas, mais uma vez o povo é explorado. As passarelas acabam ressuscitando a discriminação que sempre existiu. Os camarotes lembram a Casa Grande, onde socialites, artistas famosos, bicheiros, políticos, empresários se divertem. Na avenida desfila a submissão dos que foram condenados a “andar nos trilhos” e garantir o espetáculo dos grandes. É a fantasia, a máscara que esconde a realidade de alguns e desnuda a realidade de outros. Será que colocamos ou tiramos as máscaras durante a folia? Na verdade, muitas pessoas aproveitam a ocasião para mostrar o que são ou desejariam ser. Por pressões externas e internas, por uma série de razões, muitos se sentem forçados a passar todo o ano usando a fantasia ou máscara de personagens que não são na realidade. Outras vezes, o colorido dos desfiles, a alegria provocada pela droga ou pela bebida mascaram a dura realidade do dia-a-dia. Não desejo emitir aqui um juízo moral, mas vale a pena fazer algumas considerações, refletir: Quais são as máscaras que uso, as fantasias que visto? Consigo ser
 transparente comigo mesmo e com os outros? Preciso beber ou me fantasiar para me sentir mais solto, livre? Outra coisa que sempre me fez pensar são os chamados retiros de carnaval. Não duvido da intenção e do desejo puro de muitos de fazer do período de carnaval um momento de oração e silêncio. Essas iniciativas são bem-vindas em qualquer época e para qualquer pessoa. Porém, não consigo entender muito bem essa necessidade. Talvez porque nos meus tempos
de criança e de seminarista tenha aprendido que era necessário rezar muito para compensar os pecados dos outros que ficavam na farra. Passava-se a ideia de que a gente era santo e os que estavam na folia eram pecadores. E vinha mais uma vez a imagem da hipocrisia, a lembrança daquele fariseu a quem Jesus critica: “Eu te agradeço, Senhor, porque não sou como os demais pecadores…” (Lc 18,11). Julgar é sempre um perigo. Mas acho mesmo é que o tempo de carnaval deve ser um tempo de festa. Nada melhor que uns dias de descanso, festa, alegria, dança, para tanta gente que vive tensa, angustiada, insegura. Para um povo que sofre tanto ao longo do ano, e tem o direito de extravasar seus sentimentos, desabafar, festejar. Depois, sim, entrar no clima de silêncio e mortificação. Temos quarenta dias pela frente para nos dedicarmos à oração, meditação, jejum, caridade. A quaresma é justamente esse grande retiro que a Igreja propõe a todos. Pena que a gente não saiba curtir bem a alegria do carnaval e nem se dedica tanto ao retiro quaresmal. O carnaval de muita gente acaba sendo um tempo de hipocrisia e dor. Para muitos a ressaca não compensa a alegria. As consequências negativas tiram o brilho da festa. A fantasia vira cinzas em pouco tempo. Ou, pior ainda, a pessoa tem que vestir de novo a fantasia, colocar a máscara, e passar mais um ano representando o seu papel. Sem conseguir viver de fato a quaresma e, muito menos, celebrar verdadeiramente a Páscoa.

 
Pe. José Antônio de Oliveira

Nenhum comentário:

Postar um comentário