terça-feira, 2 de setembro de 2014

Por trás dos megatemplos…


Pe. José Antonio de Oliveira
A inauguração do “templo de Salomão”, pelo pastor Edir Macedo, em São Paulo, obra que custou quase 700 milhões de reais, traz à tona a questão dos megatemplos. No Brasil, como em outras partes do mundo, é a febre do momento. A diocese de Belo Horizonte deu início à construção da nova catedral. Obra de mais de 100 milhões. Outras Igrejas vão na mesma linha. Inúmeros templos e santuários gigantescos estão em construção ou já foram inaugurados.
O que está por trás disso? Quais são as motivações? Não tenho resposta. Mas, como muita gente, carrego um punhado de interrogações. Seria para a Glória de Deus? Pra facilitar o culto dos fiéis? Ou seria competição, disputa de poder? A motivação maior é de fé, ou vaidade e autopromoção?
É certo que celebrações esporádicas de massa ajudam, animam, fazem bem. Mas o dia a dia da fé acontece mesmo é nas pequenas comunidades, nos pequenos grupos. Os megatemplos dão visibilidade e impressionam, mas, por outro lado, alimentam a perda do sentimento de pertença e do senso de comunidade. Numa concentração de massa são todos anônimos, números, estatísticas. É cada um pra si. Cada um(a) correndo atrás da solução do ‘seu’ problema. Não se alimenta a solidariedade, a compaixão, a fraternidade.
Contudo, o que inquieta mais são os gastos exorbitantes em nome de Deus. É a busca do luxo, da ostentação, da suntuosidade, tudo em nome da fé. Será que Deus gosta mesmo disso? Será que Jesus, ao instituir a Igreja, pensou em algo assim? Difícil acreditar. Escolheu a periferia para nascer, viveu no meio dos pobres e sofredores, morreu sem a roupa do corpo, foi sepultado em túmulo emprestado. Frequentava as sinagogas, e não o templo. O pouquíssimo contato com o templo, registrado nos evangelhos, foi para derrubar as mesas e expulsar mercadores da fé. E quando alguns olhavam embasbacados para o templo de Jerusalém, admirados com sua beleza e riqueza, Jesus comenta com uma pitada de ironia: “Não ficará pedra sobre pedra” (cf. Lc 21,5).
Em nossa limitação, temos o costume de querer agradar o outro a partir do nosso gosto. E corremos o grande risco de errar. É comum alguém dizer: ‘você vai gostar!’ Normalmente erra!
Pedro fez assim. Quando Jesus quis lavar seus pés, reagiu logo: de jeito nenhum! Você é Mestre e Senhor. Não pode fazer uma coisa dessas. E Jesus responde com um ar de decepção: Você não entendeu nada, hein?! Eu não disse que, para mim e para o Reino, grande é quem serve, quem lava os pés?! (cf. Jo 13,8; Mc 9,35). Às vezes queremos agradar a Deus e fazemos justamente o contrário. “Meus pensamentos não são os vossos…” (cf. Is 55,8-9)
Deus não habita em templos feitos por mãos humanas. Ele prefere morar no coração (cf. At 17,24). Despreza a grandeza e o poder e se revela aos simples e humildes (cf. Mt 11,25).
São João Crisóstomo, bispo do sec. IV, cuja memória celebramos no dia 13 de setembro, nos deixou uma belíssima reflexão a esse respeito. Veja alguns trechos:
“Queres honrar o corpo de Cristo? Não o desprezes quando nu. Pois aquele que disse:Isto é o meu corpo (Mt 26,26) é o mesmo que falou: O que não fizeste a um destes mais pequeninos, não o fizeste a mim (cf. Mt 25,45). Este não tem necessidade de vestes, mas de corações puros; aquele, porém, precisa de grande cuidado.
Aprendamos a reverenciar a Cristo como lhe agrada. A honra mais agradável é aquela que ele prefere, não a que julgamos melhor. Deus não precisa de vasos de ouro, mas de almas de ouro. Daquelas só quem oferece tem lucro; destas, também aquele que recebe. Lá o dom parece ser ocasião de ostentação; aqui só pode ser compaixão e benignidade. Mandas levantar colunas douradas, declarando fazê-lo em sua honra? Não se julgaria isto objeto de zombaria e extrema afronta? Não o recebes como hóspede, mas ornas o pavimento, as paredes e os capitéis das colunas, prendes com cadeias de prata as lâmpadas, e a ele, preso em grilhões no cárcere, nem sequer te atreves a vê-lo. O irmão é mais precioso que o templo…”
Essa reflexão vale para todos nós. Não precisamos abrir mão da beleza; mas também não podemos ceder à tentação do luxo e da ostentação. Podemos e devemos prestar nosso culto a Deus, mas Ele quer mesmo é um coração misericordioso, marcado pela compaixão. Deus merece o melhor, mas o melhor não é feito de coisas materiais. Por trás da intenção de agradar a Deus e propagar a fé pode estar de fato a vaidade ou o mero desejo de se autopromover.