VOCAÇÃO: SOU E SEMPRE SEREI CHAMADO
Neste
mês de Agosto, a Igreja do Brasil nos propõe o mês vocacional, convidando-nos a
refletir sobre vocação de modo amplo. A palavra vocação vem do latim vocare,
que quer dizer chamado. O que implica dois interlocutores, ou seja,
um que chama e outro que ouve e responde. É Deus quem chama o ser humano e,
esse responde, ou não. Deus é sempre o interlocutor primeiro, pois a iniciativa
do diálogo sempre vem d’Ele (primereiar,
no dizer do papa Francisco).
Primeiramente,
somos chamados por Deus à vida (cf.
Gn 2,7). A existência humana é fruto do amor criador de Deus, que nos chama a vir a ser, a existir, ser gente e
construir-se como pessoa. A esse chamado buscamos responder ao longo de toda
nossa existência, num processo contínuo de personalização e construção do eu. A
realização desta vocação dependerá da participação e da experiência que
realizarmos com o próprio Deus que nos cria a sua imagem e semelhança. Isso
implica entrar na dinâmica de desenvolvimento da personalidade nos níveis
estrutural, psíquico, relacional e espiritual. Noutras palavras, a realização
vocacional permeia a busca do autoconhecimento e do auto-aperfeiçoamento. Daí,
a importância das inquietantes provocações: quem
sou eu? O que posso ser? E como posso ser? Ser pessoa implica
desenvolver relações consigo mesmo, com os outros e tudo que nos envolve e,
principalmente com Deus. Ser pessoa é dispor-se de si e dispor-se aos outros.
Recebemos
também a vocação cristã. Deus nos
chama a ser pessoa dentro de um corpo, participar da sua família. Através do
Sacramento do Batismo somos incorporados ao corpo místico de Cristo, tornando,
em Cristo, filhos adotivos de Deus. A vocação cristã leva a plenitude nossa
relação com Deus, fazendo-nos participantes da missão de Cristo como profeta,
sacerdote e rei, permitindo-nos ser “sal da terra e luz do mundo” (cf. Mt
5,13-14), pessoas cristiformizadas (tomar
a forma de Cristo). Na vivência da vocação batismal está o desenvolvimento de
nossa vocação universal que é à Santidade.
A pessoa, sendo
parte do corpo místico de Cristo, a Igreja, é chamada a desenvolver sua vocação
pessoal e cristã de modo específico, ou seja, segundo um carisma próprio. As vocações específicas são: vocação
sacerdotal, vocação religiosa, vocação leiga (matrimonial, leigo engajado
consagrado ou não). Cada uma dessas, a seu modo, expressa, em Cristo, o amor
oblativo e serviçal. Cada membro tem uma função específica neste corpo, por
isso, é importante que cada um responda consciente e generosamente ao chamado
que Deus lhe faz.
Com
efeito, refletir sobre vocação é reconhecer que o homem foi, é, e sempre será
chamado. Como peregrino, o ser humano está sempre a caminho. Essa dinâmica
marcará sempre sua existência. Para entendermos melhor essa perspectiva
processual, pensemos a vocação deste modo:
1.
Vocação
é SAÍDA: sair de si; sair do lugar em que se encontra. Sair
de seguranças possíveis, do lugar cômodo e lançar-se no terreno do
desconhecido. Terreno não somente geográfico, mas principalmente, existencial.
Sair implica esvaziar-se, deixar para trás ideias, projetos e pensamentos – na
maioria das vezes egoístas – e se colocar a caminho; enfrentando com fé as
inseguranças e medos e até mesmo os sofrimentos que o chamado possa causar.
2. Vocação é BUSCA: o
ser humano se coloca como peregrino que está sempre em busca de algo que dará
sentido à sua vida. Caminha sempre para um fim, tornando sua busca incansável
enquanto não encontra o que deseja. Esse desejo, Deus o colocou em seu coração,
em seu espírito, a fim de que o homem não se acomode enquanto não alcançar o
fim último pelo qual o ser humano anseia, que é Deus. Como já afirmara Santo
Agostinho: seu coração permanecerá
inquieto enquanto não encontrar e repousar em
Deus.
3.
Vocação
é CAMINHO: é de suma importância levar em consideração que,
para toda busca, é necessário estabelecer trajetórias, itinerários. É preciso
buscar caminhos. E o caminho como já se diz “se faz caminhando”. O certo é que
todos os caminhos nos levam a algum lugar. É preciso, portanto, ter em mente o
que eu quero para minha vida e onde eu quero chegar, para saber qual o caminho
que devo percorrer, ou pelo menos, onde não quero chegar jamais.
4. Vocação é DESCOBERTA:
todo aquele que busca, encontra. No itinerário vocacional, o homem está sempre
num processo permanente de descoberta. À medida que caminha, realiza algumas
chegadas. Às vezes, nem sempre desejadas, no entanto, necessárias. O que se
verifica é que, entre saídas e chegadas, o homem sempre descobre algo e,
principalmente, se descobre. Vocação é descoberta, e essa sempre exige de nós o
acolhimento - ou não - das surpresas de Deus. Nos passos percorridos e na
descoberta alcançada, se encontra a realização de nossa vocação.
Deus nos chama,
aponta-nos o caminho, envia-nos. Respondo, sigo e me entrego! Enfim, a vocação
faz parte da existência humana em sua totalidade; faz parte dessa inquietude
humana que busca sempre algo mais, que busca sentido. No peregrinar desta
existência, é que o homem compreende seu chamado, sua essência. E é neste
constante movimento de saídas e chegadas que ele vai se realizando enquanto
pessoa, imagem de Deus, ser vocacionado.
Gilsimar Tavares
Vieira
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